A lógica da arrogância de José Dirceu

A filósofa socialista Rosa Luxemburgo dizia que o discurso desnuda a alma. O agora ex-ministro José Dirceu deu uma prova inconteste deste fato ontem.

Seu discurso demonstra grande arrogância. Fruto da prepotência dos que chegam ao poder e deixam de enxergar seus próprios limites. Não, não estou falando das denúncias de corrupção. O discurso desnuda que José Dirceu se via dono de um poder que a nação não delegou a ele. Se teve, não deveria.

Vamos aos fatos. Em sua carta de demissão, o ex-ministro aponta como razão de seu pedido os "ataques desferidos nos últimos dias ao nosso governo, ao nosso partido e a mim mesmo". Em sua resposta, o presidente começa "Querido Zé". Erra na saída. Dá outra amostra de não entender o que seu nada saudoso antecessor José Sarney chamava de liturgia do cargo. Mais adiante, emenda "esta decisão permitirá a você melhor defender nosso governo, nosso partido e sua própria pessoa".

Até aí, nada de mais. Porém o discurso de despedida, como dizia a filósofa, desnuda a alma do ex-"primeiro ministro". Tendo a presença do ministério em peso ao seu lado, diz:

- "... denúncias contra minha pessoa, meu partido, meu governo..."

Onde está o pronome nosso usado tanto por ele, quanto pelo real destinatário do poder emanado das urnas?

Continua:

- "... sonhei em governar o Brasil, ao lado do presidente Lula..."

Ao lado? Não seria melhor dizer sob a liderança do presidente Lula, ex-ministro?

Mas não é só, pois ainda afirma:

- "...vou continuar a governar o Brasil como deputado e dirigente do PT..."

Está certa Rosa Luxemburgo. O discurso desnuda a alma do nobre deputado.

Vivemos sob o regime presidencialista. Quem governa o país é presidente eleito pelas urnas. Não seu partido, nem sua bancada.

Assim, ocorre no regime parlamentarista. Porém, o PT não é favorável ao parlamentarismo. Regime que aprecio, particularmente.

O deputado confirma um fator estrutural que está na origem da crise. Este governo não é capaz de separar o partido do presidente do poder executivo. O José Dirceu confundia seu poder no PT com uma delegação para governar o país.

Já vai tarde. Tomara que consiga limpar sua honra. Eu duvido. A sabedoria popular proclama: diz-me com quem andas e te direis que és. Foi José Dirceu que escolheu andar com Roberto Jefferson. Assim como foram seus escolhidos aliados que deflagaram a crise que atinge o país. Não foi a oposição.

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