Lost in translation no Japão
Como previsto, o oscarizado Lost in Translation não agradou os japoneses. É sempre uma tarefa difícil fazer uma comédia no Japão sem ofender a cultura local. Imagine então um filme de Holywood, onde tudo é homogeinizado, encaixotado e revendido para um público que não conhece e não está preocupado em descobrir outros modos de encarar a vida.
O correspondente do Christian Science Monitor, Robert Marquan, fez um artigo muito bacana a respeito da recepção do filme no Japão. Marquan destaca um fato interessante para abrir os olhos dos ocidentais: os 3 reféns libertados na semana passada foram alvo de críticas por pertubarem a política externa japonesa. Além disso, a família das vítimas pediu desculpas publicamente por denegrirem a imagem do país.
Japan's self-image is a subject so sensitive that it rarely gets raised among gaijin, or foreigners. An exception came last week when statesman Yasuhiro Nakasone, speaking minutes after Vice President Richard Cheney, insisted it is time for Japan to be a "normal nation," and shed its postwar image of US dependence.
Even the Japanese hostages in Iraq last week unveiled the different approach here. E-mail postings were actually critical of the three hostages for disrupting Japanese foreign affairs. Their family members apologized publicly for damaging Japan's image.
Isso sem contar o suicídio dos donos da granja contaminada com a gripe do frango que na nota de despedida pediram desculpas pela grande inconveniência para a sociedade causada por eles (veja nota) no começo do mês passado e o fato de que os japoneses foram os primeiros a usar táticas suicidas envolvendo aviões contra alvos americanos.
Não dá para dizer que o ocidente não conhece a cultura japonesa. Crianças de todo o mundo assistem a filmes de monstro, curtem pokemón e Mario Bros. Adultos apreciam Kurosawa, Ozu, Mishima, etc. Milhões em todo o mundo comem peixe crú com arroz grudento, cantam no karaokê, lutam Judõ, Aikidõ e outros dõs, etc.
No mundo dos negócios, mesmo com mais de 10 anos de economia parada, o modo de pensar da terra do sol nascente é estudado com alguma profundidade. Vale dar uma olhada, por exemplo, nesse artigo do professor da FEA, Henrique Ratterner, na Revista Espaço Acadêmico sobre o milagre japonês da segunda metade do século XX.
Em um lar japonês tradicional, opiniões e decisões de seus membros são tidas como unânimes, ou seja, todos aceitam a opinião do chefe e qualquer contradição será considerada imprópria, por perturbar a ordem e a harmonia do grupo. Transferido para o âmbito da empresa, empregado e empregador consideram a relação como totalmente envolvente (marugakae), semelhante à família. Ainda segundo Nakane, essa característica se verifica desde o período Meiji até o presente, o que explicaria o imobilismo do trabalhador japonês.
O sistema de emprego vitalício - introduzido no período pós-guerra, com o beneplácito do Estado - revela vínculos estreitos e características estruturais e ideológicas com a administração dos lares e das empresas e forma a base para o envolvimento e a participação dos indivíduos, enfatizando-se a maior importância de atitudes morais e patrióticas. O sentido de coesão e unidade grupal forma a base para o envolvimento e a participação emocional dos indivíduos no grupo, construindo um mundo à parte, ao lado e em oposição aos de “fora”. Mais do que em outras culturas, na sociedade japonesa as relações com os “outros” são vistas como opostos dificilmente conciliáveis.
Mesmo assim, Hollywood premiou um filme que ofende o país onde foi filmado. Nestes tempos de intolerância extrema no Oriente Médio, seria bom a indústria de entretenimento popular americana tomar mais cuidado.
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Comentários
Covarde Anônimo (não verificado)
dom, 12/12/2004 - 23:03
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Eu moro no Japão há três a
Eu moro no Japão há três anos. Estudo e trabalho aqui. Na época em que este filme foi lançado não vi nenhuma crítica negativa, nem na tevê nem nos jornais daqui. Pelo contrário, pareciam satisfeitos com o fato de que o Japão e coisas do Japão estavam sendo mostradas em filmes de Hollywood. Isto com relação a este filme e a O Último Samurai. O Último Samurai, na minha opinião foi um desastre. Até eu me senti um pouco ofendido por aquele filme, cuja maioria das cenas nem foi filmada aqui.
Recentemente eu assiti Lost in Translation e fiquei impressionado com como o filme conseguiu mostrar, sem exageiros e sem deboches, o Japão como ele é. Eu trabalho em um hotel aqui e posso dizer que não é vejo situações como a do filme toda semana. Vejo grupos de quatro, cinco japoneses esperando a chegada de um estrangeiro e se comportanto exatamente como no filme. Freqüento karaoke e game center e esses também são exatamente como os que aparecem no filme, inclusive aquele jogo do taiko (tambor japonês) é um dos meus preferidos. E, qualquer estrangeiro que se aventurar entrar numa danceteria ou bar no Japão vai, sem dúvidas, passar por situações semelhantes às que os personagens do filme passaram (eu já passei por isso). A única coisa que eu achei difícil de acontecer é a moça entrar numa boate de strip tease e, mais difícil ainda um estrangeiro, que ainda por cima não fala japonês, entrar sozinho nessa mesma boate.
Covarde Anônimo (não verificado)
qui, 22/04/2004 - 10:46
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Não sei Charles. Não tõ afim de entrar na qualidade do filme.
Tõ comentando só o resultado: o filme que conta com uma grande campanha de marketing em todo o mundo foi praticamente escondido no local onde foi filmado pq ofende a sensibilidade dos anfitriões.
Covarde Anônimo (não verificado)
qui, 22/04/2004 - 08:23
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China, mas é impressão minha ou as piadas do filme eram feitas em cima dos japoneses ocidentalizados?
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